No corpo de doutrinas de algumas Igrejas, há uma que versa sobre a Mordomia Cristã, ou seja, que fala sobre como nós, os que crêem em Jesus, somos apenas administradores daquilo que Deus nos tem dado: saúde, casamento, filhos, dinheiro, patrimônios, emprego, corpo, etc. E sendo administradores, temos como finalidade utilizar o quenos é dado em benefício do Reino de Deus, a saber: o cuidado pessoal, familiar e, também, dos desamparados. Sim, ainda que nos sintamos desconfortáveis em entender que o nosso dinheiro não é nosso, mas é do Senhor, e que o objetivo é, além de nós, cuidar dos que não o tem, este é o princípio doutrinário da Mordomia Cristã. É verdade que isso se aplica, também, as Igrejas, ou seja, elas também têm de socorrer os desamparados, visto que o dinheiro que arrecadam tem essa mesma finalidade. Mas o desconforto proveniente do objetivo da Mordomia Cristã se dá, principalmente, pelo fato que a medida que vamos ganhando dinheiro, acumulando patrimônio, ficamos cada vez mais apegados a essas coisas, ao ponto de termos dificuldade, por exemplo, de socorrer até alguém conhecido que esteja passando por dificuldades. Alguns dos povos antigos tinham um panteão de deuses, dentre estes, havia um chamado Mamon, o deus das riquezas. Muitos o cultuavam porque entendiam que a medida que o servissem, se tornariam prósperos. Assim, ao cultuá-lo, os fiéis não podiam ajudar a quem quer que fosse, visto que todo o dinheiro que possuíam estava consagrado a tal deus. Em pleno século XXI, tenho a impressão que muitos cristãos e algumas igrejas cristãs ressuscitaram ao deus Mamon. Aliás, não somente os religiosos, até os não-religiosos e ateus cultuam a Mamon. Digo isso porque o comportamento de muitos desses grupos demonstra tal adoração. Há religiosos que ofertam determinados valores em suas igrejas, porém, não socorrem um vizinho, amigo ou parente que esteja passando por alguma dificuldade; há igrejas que arrecadam muito dinheiro, porém, ao invés de aplicar os recursos segundo os valores do Reino, investem em mega-templos e outros patrimônios; conheço pouquíssimas comunidades religiosas que servem a população carente de educação e cuidado, com creches, escolas ou assistência social. Um dos reformadores da Igreja no século XVI, João Calvino, entendia que cada Igreja deveria abrigar uma escola, uma unidade de educação e, portanto, libertação através do conhecimento ao povo. Infelizmente, nosso apego ao que tempos não nos permite olhar ao redor, não nos permite compartilhar, e, portanto, afasta-nos da solidariedade. À medida que tudo o que fazemos e ganhamos é apenas para nós mesmos, contribuímos para o fortalecimento de uma sociedade cada vez mais exploradora - das pessoas e dos recursos naturais - e cada vez menos solidária. Assim, fica cada vez mais distante de nós o conselho do autor de Provérbios no sentido de defender aqueles que necessitam de defesa porque não tiveram as oportunidades que temos. Porém, depois ninguém poderá se queixar da violência, da falta de educação, e, consequentemente, da prisão domiciliar. Sim, porque numa sociedade que explora uns aos outros, e que por conta desta exploração contribui para o desenvolvimento da violência, a vida se tornará cada vez mais enclausurada em mausoléus. Será que, enquanto é tempo, não está na hora de nos tornarmos mais solidários e, assim, fazer com que a nossa vida, assim como tudo o que temos, tenha algum sentido que confira um novo valor à nossa existência? Pensemos nisso.
Com carinho e amizade,
Pr. André Luís Pereira